Da oferta de emprego <i>versus</i> nível de formação
Aparte talvez as qualificações específicas a nível superior – conferidas por universidades, por politécnicos – na área genericamente designada por «informática», as outras nas outras áreas parecem corresponder a um factor negativo por parte de quem as possui e consequentemente se candidata – em particular os jovens – a postos de trabalho, ou o que quer que se entenda hoje em dia por esta expressão.
Escrevi acima talvez porque já não são um nem dois nem três desses informáticos, em particular sendo engenheiros informáticos, que vejo escaparem-se para fora do país. Aliás, repete-se um exemplo «clássico» presenciado na televisão: primeiro-ministro José Sócrates, de visita à Finlândia – acho que em Helsínquia, a memória já se vai esbatendo –, apresentado a engenheiros portugueses empregados pela Nokia; primeiro-ministro embevecido pelo exemplo, e orgulhoso pela sua qualidade, demonstrando quanto valem os «nossos»; um dos nossos, respondendo, «pois só cá estamos por que não encontrámos trabalho em Portugal, respondemos a anúncios e cá viemos parar, cá nos aceitaram» (a Finlândia é um dos países do mundo como uma maior percentagem na população em termos de formação superior universitária, e, mesmo assim, precisa de mais trabalhadores com estes níveis de qualificação – e não serão apenas, nem maioritariamente, portugueses os que para lá emigram!).
Já uma pessoa próxima de mim, há pouco desaparecida, uma pessoa muito lúcida e com uma longa e impecável carreira profissional, um alto funcionário, sempre recusando os compadrios – aliás, o compadrio de diversos tipos é o método mais infalível de «progressão» nas mesmas carreiras –, mas dizia-me essa pessoa, lá por finais de 2007 – data referida aqui só para situar no tempo essa conversa –, que devíamos dissuadir os nossos jovens de alcançarem muita formação, sobretudo doutoramentos, porque isso era caminho quase andado por inteiro para não conseguirem arranjar trabalho. À guisa de explicação, acrescentava que tal acontecia por os empregadores se assustarem, terem medo de tais pessoas lá para a sua empresa, ou lá para o seu serviço. Além de que, por outro lado, os jovens – continuou essa pessoa a dizer-me –, sentindo-se de posse de tais capacidades e vendo que isto por cá não dá para nada, emigrarão como já muitos estão a fazer (estaria a pensar num filho que, depois de doutorado, ficou pelas estranjas, aí casou, aí está a ter filhos, e com os quais, já que dispunha de acesso de «banda larga» à Internet, comunicava por messenger e por videotelefone, servindo-se do ecrã do seu computador (poupando assim dinheiro tanto nas contas de telemóvel como nas chamadas de longa distância do serviço telefónico fixo)? Eles vão-se embora, e ficamos sem eles? – terríveis, as saudades dos pais, com estes mais a mais na fase de saída da carroça [da Vida], que hoje é mais cedo que antes (aparente paradoxo em face de uma acrescida longevidade, que «implica» que se vá sofrendo de abaixamentos progressivos de pensões de reforma).
Dramas
Tudo isto a ocorrer-me, estimulado (eu) por ocasião da passagem de uma novela na televisão, ali pelos lados do ecrã postado naquele canto da sala. Era uma espécie de tragédia da coxinha, mas com laivos de dramas próprios do viver de hoje. O «chefe de família», um «gestor» de médio coturno, desempregado recente, com um filho doente grave de fresca data, um «chefe de família» desmoralizado por estar a ser sustentado pela sua mulher, um «chefe de família» que acabou por empregar-se em turnos nocturnos como gerente de um «importante» hotel. Entretanto – e era onde estávamos – o tal colarinho branco desempregado queixava-se de que não podia, enquanto procurava emprego, referir-se a sua formação superior, universitária, senão eliminavam-no como hipótese logo à partida. É claro que logo a seguir viria uma novela onde os exemplos estelares são profissionais informáticos de elevado calibre (ainda não há muito, eram os pilotos da aviação). Mas, de qualquer forma, o exemplo afirmado de, em geral, licenciados nem os querer ver, parece-nos que possui um decisivo significado.
Dramas de trabalhadores ditos da «classe média», ou mesmo «classe média alta» – dir-se-á –, dramas diferentes dos dramas que ocorrem com os vividos pelas gentes da «classe dos mais desmunidos» – um violento eufemismo –, mas, de qualquer maneira, são dramas. E dramas a lembrarem tempos de grande crise, como os dos fascismos nascidos na primeira metade do século XX.
Escrevi acima talvez porque já não são um nem dois nem três desses informáticos, em particular sendo engenheiros informáticos, que vejo escaparem-se para fora do país. Aliás, repete-se um exemplo «clássico» presenciado na televisão: primeiro-ministro José Sócrates, de visita à Finlândia – acho que em Helsínquia, a memória já se vai esbatendo –, apresentado a engenheiros portugueses empregados pela Nokia; primeiro-ministro embevecido pelo exemplo, e orgulhoso pela sua qualidade, demonstrando quanto valem os «nossos»; um dos nossos, respondendo, «pois só cá estamos por que não encontrámos trabalho em Portugal, respondemos a anúncios e cá viemos parar, cá nos aceitaram» (a Finlândia é um dos países do mundo como uma maior percentagem na população em termos de formação superior universitária, e, mesmo assim, precisa de mais trabalhadores com estes níveis de qualificação – e não serão apenas, nem maioritariamente, portugueses os que para lá emigram!).
Já uma pessoa próxima de mim, há pouco desaparecida, uma pessoa muito lúcida e com uma longa e impecável carreira profissional, um alto funcionário, sempre recusando os compadrios – aliás, o compadrio de diversos tipos é o método mais infalível de «progressão» nas mesmas carreiras –, mas dizia-me essa pessoa, lá por finais de 2007 – data referida aqui só para situar no tempo essa conversa –, que devíamos dissuadir os nossos jovens de alcançarem muita formação, sobretudo doutoramentos, porque isso era caminho quase andado por inteiro para não conseguirem arranjar trabalho. À guisa de explicação, acrescentava que tal acontecia por os empregadores se assustarem, terem medo de tais pessoas lá para a sua empresa, ou lá para o seu serviço. Além de que, por outro lado, os jovens – continuou essa pessoa a dizer-me –, sentindo-se de posse de tais capacidades e vendo que isto por cá não dá para nada, emigrarão como já muitos estão a fazer (estaria a pensar num filho que, depois de doutorado, ficou pelas estranjas, aí casou, aí está a ter filhos, e com os quais, já que dispunha de acesso de «banda larga» à Internet, comunicava por messenger e por videotelefone, servindo-se do ecrã do seu computador (poupando assim dinheiro tanto nas contas de telemóvel como nas chamadas de longa distância do serviço telefónico fixo)? Eles vão-se embora, e ficamos sem eles? – terríveis, as saudades dos pais, com estes mais a mais na fase de saída da carroça [da Vida], que hoje é mais cedo que antes (aparente paradoxo em face de uma acrescida longevidade, que «implica» que se vá sofrendo de abaixamentos progressivos de pensões de reforma).
Dramas
Tudo isto a ocorrer-me, estimulado (eu) por ocasião da passagem de uma novela na televisão, ali pelos lados do ecrã postado naquele canto da sala. Era uma espécie de tragédia da coxinha, mas com laivos de dramas próprios do viver de hoje. O «chefe de família», um «gestor» de médio coturno, desempregado recente, com um filho doente grave de fresca data, um «chefe de família» desmoralizado por estar a ser sustentado pela sua mulher, um «chefe de família» que acabou por empregar-se em turnos nocturnos como gerente de um «importante» hotel. Entretanto – e era onde estávamos – o tal colarinho branco desempregado queixava-se de que não podia, enquanto procurava emprego, referir-se a sua formação superior, universitária, senão eliminavam-no como hipótese logo à partida. É claro que logo a seguir viria uma novela onde os exemplos estelares são profissionais informáticos de elevado calibre (ainda não há muito, eram os pilotos da aviação). Mas, de qualquer forma, o exemplo afirmado de, em geral, licenciados nem os querer ver, parece-nos que possui um decisivo significado.
Dramas de trabalhadores ditos da «classe média», ou mesmo «classe média alta» – dir-se-á –, dramas diferentes dos dramas que ocorrem com os vividos pelas gentes da «classe dos mais desmunidos» – um violento eufemismo –, mas, de qualquer maneira, são dramas. E dramas a lembrarem tempos de grande crise, como os dos fascismos nascidos na primeira metade do século XX.